Aos fins do século XVIII, a destruição do quilombo de Palmares deixa poucos dados disponíveis para uma biografia adequada de Zumbi.  Mas, a despeito de todas as dificuldades acreditamos que uma História do Brasil estaria incompleta se Zumbi, herói popular não fosse incluído.

                      Dados históricos recorridos à sociologia e à antropologia:

1600 – Dezenas de escravos fugitivos dos engenhos de açúcar já se localizavam na sera da Barriga.
1602 – Primeira entrada de Bartolomeu Bezera contra o refúgio da serra.
1630 – Holandeses em Pernambuco- fuga dos escravos para o quilombo já conhecido como Palmares.
1644/45 – expedições holandesas contra Palmares.
1654 – Holandeses expulsos do Brasil.
1660 – Ganga Zumba e Gana Zona ocupavam a chefa dos principais mocambos de Palmares.
1668 – Alagoas, Porto Calvo e depois Serinhaém assinam a “União Perpétua” contra Palmares.
1670 – Palmares chega ao apogeu, com talvz 50 mil habitantes.
1671/73 – Fernão de Sousa Coutinho abre luta contra Palmares com poucos resultados.
1674 – Pedro de Almeida organiza novas expedições. Os combates tornam-se sangrentos.
1675 – Manuel Lopes destrói a “Cerca do Macaco”.
Nos combates que se seguem Zumbi é baleado duas vezes.
1678 – Ganga Zumba e Pedro Almeida negociam a paz. (Ato considerado pelos quilombolas como traição).
1678/79 – Os partidários de Zumbi assassinam Ganga Zuma. A luta recomeça.
1691 – O bandeirante Domingos Jorge Velho lança seus homens contra as tropas de Zumbi que contra ataca devastando suas fileiras.
1692 – Inicia-se a tentativa de cerco as fortalezas de Palmares.
1694- Três anos após com reforço de artilharia, Domingos Jorge Velho consegue destruir Palmares.
1695 – Denunciado por um prisioneiro, Zumbi é atacado por André Furtado de Mendonça e resiste até a morte.

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A criatura que chamamos ZUMBI nasceu livre em qualquer ponto dos Palmares, em 1655. Talvez no começo do ano, quando a água nas cisternas é pesada e morna; talvez no meio ou no fim, quando o chão está coberto de buritis podres. Um dia saberá bastante sobre ele. Milhares de documentos amarelos, difíceis de ler, guardam a história do preto pequeno e magro que venceu mais batalhas do que todos os generais juntos da Histório Brasileira terrível às cercanias de Porto Calvo. Diziam outros que a moça lhe fora ao encontro de próprios pés; terceiros, que era herdeira de família senhorial extraviada nas brenhas vizinhas de Palmares.

Até aqui, os papéis amarelados, de sintaxe arrevesada, não disseram sim ou não à legenda romântica. Tudo começou com um Brás da Rocha que atacou Palmares em 1655 e carregou, entre presas adultas, um recém-nascido. Brás o entregou, honestamente, como era do contrato, ao chefe de uma coluna, e este decidiu fazer um presente ao cura de Porto Calvo. Padre Melo achou que devia chamá-lo "Francisco". Não podia, naquele momento, adivinhar que se afeiçoaria ao pretinho. Se pode imaginar que não foi das piores a infância de Francisco. O padre talvez o batesse, como mandava a época, mas não lhe faltou alimento e remédio. "Quem dá os beijos, dá os peidos", dizia o povo. Padre Melo achava Francisco inteligentíssimo; resolveu desasná-lo em português, latim e religião.

Talvez olhasse com orgulho o moleque passar com o turíbulo, repetir os salmos. Francisco apreciava, certamente, histórias da Bíblia. Havia esta, por exemplo: Um sacerdote de nome Eli, velho e piedoso, aceitou na sua casa um menino chamado Samuel. Samuel ouviu que lhe chamavam "Samuel! Samuel!" isto foi antes que a lâmpada de Deus se apagasse no templo do Senhor: ali dormia a Araca de Jeová. Samuel foi até o quarto de Eli: "O senhor me chamou? Estou aqui..."; "Não te chamei, filho" - respondeu o velho - "Torna-te a deittar." Na terceira vez, Eli compreendeu de quem era a voz "Vai te deitar, e quando te chamarem de novo responde: Fala, porque o teu servo ouve." Assim fez, e a voz queria que ele a seguisse; e deixou um recado para o sacerdote: que julgaria a sua casa para sempre, pela iniquidade que ele bem conhecia, porque fazendo-se os seus filhos indesejáveis, não os repreendeu.

Numa noite em 1670, ao completar quinze anos, Francisco fugiu. Aos quinze anos deixaria a liberdade e o conforto de Padre Melo para voltar a Palmares. Aos vinte e três anos recusou a paz que Ganga Zumba firmara com os brancos, paz que lhe garantia a liberdade pois nascera em Palmares. Aos vinte e cinco anos, incompletos, fechou, enfim, a última porta: continuaria em Palmares para combater.

ZUMBI DOS PALMARES foi por muito tempo - até hoje no Brasil - recordista de vitórias militares. Zumbi lidorou Palmares por muitos anos. Guerreiro imbatível, venceu mais batalhas do que todos os generais juntos, da História Brasileira. Zumbi tinha uma grande diferença desses generais, que combatiam para conquistar territórios ou para escravizar. Zumbi lutava para sobreviver e não ceder à escravidão. Zumbi é o maior símbolo de resistência de nossa história.

O QUILOMBO DE PALMARES resistiu aos ataques das expedições mandadas pelos seus governadores da época, quase por um século, vindo a ser destruído em 1694, pelo bandeirante paulista Domingos Jorge Velho, o qual já era exímio caçador e assassino de índios, não se sabendo quantos mil índios este homem matou, sabendo que ele partiu contra Palmares, com toda fúria e ira, com seus canhões cuspindo fogo. Seus soldados massacrando mulheres e crianças sem um pingo de compaixão.

Zumbi e seus guerreiros lutavam como nunca, pois esta era a batalha final. Zumbi lutou até o último momento, mas foi impossível vencer os canhões de Domingos Jorge Velho. Zumbi vendo a batalha perdida, fugiu para tentar construir um novo Palmares, mas um ano mais tarde, foi traído, vindo a ser morto nas brenhas da Serra Dois Irmãos por volta de cinco horas da manhã de 20 de novembro de 1695. Seu corpo foi esquartejado, sua cabeça ficou exposta em uma praça em Recife para servir de exemplo para aqueles que quisessem resistir a escravidão. Morreu, mas não se entregou ao cativeiro.

E a cultura afro-brasileira está mais forte do que nunca, como a Capoeira, o Maculelê, a dança afro, o samba e muitos outros segmentos. A Capoeira foi registrada por alguns na história do Quilombo de Palmares, por isto acreditamos que em cada movimento ou gesto da cultura afro-brasileira, Zumbi renasce.

A Capoeira é a luta de resistência , é uma luta de quebra de preconceitos. A Capoeira traz uma magia, que encanta pessoas de todas as raças e classes sociais, fazendo com que elas se integrem e construam um mundo sem preconceitos e discriminações.

Era por isto que Zumbi lutava não só por liberdade, mas também por igualdade. E a Capoeira traz esta proposta, e é por isto que é impossível falar de Capoeira sem falar neste baluarte da nossa História Brasileira.

A última chance de Domingos, comandante do exército colonial, que nunca tinha visto nada parecido em toda sua vida. Custava a crer que fosse obra de negros. Entre o verde do mato e o azul puríssimo do céu - numa extensão semi-circular de cinco quilómetros e meio - se erguia a escura muralha de troncos e pedras. Dez homens, um de pé no ombro do outro, não tocariam sua borda. Olhando melhor se descobria que não era uma, mas três muralhas - e tinha redentes, guaritas, quebrava em diversos lugares, abria torneiras para atiradores a cada dois metros. Domingos ordenou que batedores se aproximassem; caíram nos fossos que circundavam a fortificação e agonizavam agora, estrepados em puas de ferro que entravam pela virilha e saiam na garganta. Um dos subcomandantes lhe deu, então, a idéia de construir contracercas de proteção, enquanto traçavam o planal final de ataque. Foram erquidas, de troncos de árvores, rapidamente - cada uma com quinhentos metros. Na antemanhâ de 23 de janeiro, mal se aquietou a lúgubre orquestra de sapos. Somente um capitão, com cinquenta homens, conseguiu sob uma chuva de flechas e balas encostar na muralha palmarina, atacando-a com machados. Os quilombolas, lá do alto, lhes abriam as cabeças com pedregulhos enormes, pescando os sobreviventes a gancho, pelas costas. Fracassado o assalto, Domingos temeu pela própria segurança do seu acampamento. Mandou buscar reforços no Recife; vieram cerca de duzentos homens e seis canhões. Inútil, mesmo sob proteção das contracercas, a distância continuava demasiada para o alcance dos canhões. Os pelouros caíam murchos, como bexigas de brinquedos, em terra de ninguém.

Na noite de 5 de fevereiro, a raiva de Jorge Velho cedeu vez à inteligência. Ela se sentou na rede, chamou os subcomandantes e traçou com um graveto, no chão, a única saída. Imediatamente ordenou que começassem, em silêncio, a construção desta nova contrcerca, oblíqua à muralha palmarina. Deviam levá-la até encostar no grande precipício esquerda do Macaco, tão rápido que tivesse pronta a clarear do dia seguinte. Então, veriam aqueles negros do diabo. Quando, no meio da noite, Zumbi de Palmares descobriu o ardil de Jorge Velho, sua primeira providêia foi executar o sentinela que não dera o alarme. O desespero, talvez mais que a raiva, explica essa violência miúda no turbilhão de uma guerra total. Zumbi de Palmares estava mais uma vez encurralado e com uma única chance de escapar. Até quando teria que jogar aquele jogo sem fim? Há pelo menos 25 anos, ele, pessoalmente, ganhava e perdia batalhas. A guerra tinha, no entanto, cem anos - desde que aquele punhado de negros incendiou a fazenda do amo, no sul de Pernambuco, e se abrigou na Serra, fundando Palmares. Zumbi juntou os comandantes e oficiais. Possivelmente, então, lhes confessou o fracasso do plano que urdira, atrair o exército colonial em peso para uma grande batalha às portas da capital e massacrá-lo. Se perdessem, os sobreviventes poderiam recomeçar em outro lugar - eles seriam o novo Palmares. Se vencessem, o governo colonial ficaria de tal forma fraco e demoralizado que aceitaria Palmares como nação soberana.

Em qualquer dos casos, Palmares viveria. Na beira do abismo, do lado ocidental da fortificação, restava uma passagem que o inimigo não tivera tempo de fechar. Por ali sairiam os guerreiros - somente os guerreiros, sem mulheres e crianças - rápidos e mudos. Recompostos em algum ponto, recomeçariam a guerra.

Quando passaram os últimos, porém, rolaram pedras. Um mameluco abriu fogo sobre eles. Sem saber se combatiam ou escapavam, os guerreiros palmarinos se entrecochavam. Foi o pânico. Perto de duas centenas despencaram pela cratera sem fundo. Jorge Velho não quis persegui-los. A caça melhor estava dentro. Mandou os canhões cuspirem fogo contra a cidadela. Pelos escombros da formidável parede, a multidão de índios, mamelucos e soldados finalmente penetrou em Palmares. Na sua fúria nada deixaram de pé ou inteiro.

Isto foi apenas um resumo da história de Zumbi de Palmares.

Comemoramos o 20 de novembro, não como a morte de Zumbi, mas sim como a verdadeira abolição da escravatura.

Material colhido em : http://br.geocities.com/jeronimocapoeira/zumbi.html

 

ZUMBI E O DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA

ZUMBI E O DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA:

ENREDO: No Brasil, comemoramos o Dia da Consciência Negra em 20 de novembro, dia da morte de Zumbi. Lembramos a importância do Quilombo dos Palmares e de todas as pessoas comprometidas no combate ao racismo, na luta por uma sociedade capaz de assegurar justiça, solidariedade e igualdade com respeito à diversidade. As escolas não podem ficar de fora. No seu projeto Político Pedagógico, na sua concepção de currículo o compromisso com a erradicação do racismo, discriminação e preconceito deve estar presente. Nesta radionovela estamos dando os primeiros passos...juntos.



Locução 1: (Narrador)-No Brasil, comemoramos o Dia da Consciência Negra em 20 de novembro, dia da morte de Zumbi. Lembramos a importância do Quilombo dos Palmares e de todas as pessoas comprometidas no combate ao racismo, na luta por uma sociedade capaz de assegurar justiça, solidariedade e igualdade com respeito à diversidade.

Personagens (Narrador)-Toinzinho, Ana, seu Francisco, Mazinho, Joana.

Técnica: Música preferida pela raça negra e que tenha haver com suas tradições.

Técnica: Barulho de escravos trabalhando e conversando.

Locução 2: (Narrador)- (Conversa entre os participantes da novela-Elenco formado por crianças e adultos).

Locução 3(Narrador)- Mazinho e Ana correndo com um presente na mão encontram Toinzinho e convidam-no para o aniversário do bisavô da Joana!.

Mazinho e Ana gritam! Toinzinho! Toinzinho! Vamos pra festa de aniversário do bisavô da Ana! Toinzinho responde: Eu já ia mesmo te chamar, Mazinho!
(Mazinho)-Afinal, não é sempre que se comemora 110 anos! (Toinzinho)- É mesmo! Ele é o morador mais idoso da cidade! Merece todo nosso respeito! De repente Joana aparece e diz: Oi, turma! A festa já vai começar, vamos lá prá casa! Seu Francisco estava sentado numa cadeira quando a gurizada entrou gritando! Feliz aniversário, seu Francisco! O bisavô de Joana contente disse: Olá! E, cheio de felicidades abraça a todos! Emocionado diz: é muito bom ser lembrado e estar festejando com pessoas de vários povos!

Técnica: Música de aniversário.

(Toinzinho exclamou)- Como assim, seu Francisco? Nem sempre foi assim meu filho! As outras crianças ouviam atentas seu Francisco Falar: Antigamente, as coisas eram diferentes! Os negros como eu eram tratados como coisas, simples coisas, não como seres humanos!(Joana) de repente Joana fala para seus amiguinhos: É porquê nossa família foi trazida à força da África para o Brasil como escravos! Os amigos de Joana gritavam: eu conheço a África! É a terra dos leões... e dos filmes de Tarzan!

Técnica: Grito de Tarzan na selva.

Seu Francisco ficou imaginando e falando baixinho: Sim...e dos homens nus e selvagens...Elevou a voz: infelizmente essa é a imagem que a maioria das pessoas têm da África! Continuou: mas a verdade não é essa! Garotada! A África, antes de ser colonizada, era composta de vários Estados, reinos e até impérios! Isso quer dizer que lá existia uma organização social e política, território definido, vida organizada, cidades estruturadas, urbanização,enfim muita coisa havia...Falou um pouco mais alto dizendo: como por exemplo o Império de Gana no século XIII, de Mali no século XIV e o império de Songai, do século XVI ao XVIII.
Toinzinho abriu os braços e bradou: Quer dizer seu Francisco que a África estava inserida no mundo!!! Seu Francisco respondeu SIM!!! E continuou: os africanos comercializavam com a China! Por exemplo, veja esta gravura do século VII em que africanos são representados negociando com os chineses!

Locução 4:(Narrador)-Toinzinho e Mazinho perguntaram ao Seu Francisco?

Então os povos da áfrica se comunicavam entre si? Seu Francisco: É claro! Eles se conheciam! Exemplo disso é a expansão da tecnologia do ferro através do comércio, guerras e mudança de povos! O uso do ferro exigia conhecimentos de química , construção de fornos e sociedades organizadas! No deserto foram construídas cidades, organizadas rotas comerciais de caravanas e floresceram centro de estudos por viajantes do comércio!

Locução 5: (Narrador)-E, ‘continua animado contando a gurizada os feitos de seu povo’:

(Seu Francisco): Os grandes rios africanos foram fundamentais para o crescimento da população e transporte de produtos! Portanto, eles conheciam a tecnologia da navegação!

Locução 6:(Narrador)- Toinzinho o mais curioso, indagou:
(Toinzinho)- Puxa...eu pensava que a África era toda igual!

(Seu Francisco)- Não é não! A África hoje é formada por 53 países, com religiões diferentes, costumes diferentes...Esses países estão bem organizados, assim como existe o Mercosul e outros blocos econômicos, os países africanos criaram em 1963 a Associação dos Países Africanos para cooperação mútua e eliminação do colonialismo! Temos que apagar as imagens que temos do continente africano e construir outras mais positivas! Os africanos estão integrados na base de formação étnica e cultural do Brasil! Por isso é preciso conhecer melhor a realidade dos negros no nosso país!

Locução 7: (Narrador)-Toinzinho espantado responde:

(Toinzinho) Seu Francisco o senhor sabe tudo isso?

Locução 8 :(Narrador)- Seu Francisco respondeu:

(Seu Francisco) Sim, minhas queridas crianças!

Locução 9 :(Narrador)-Toinzinho ainda admirado com todo desfecho da conversa disse:

(Toinzinho) Na escola aprendemos que antigamente existiam escravos negros no Brasil! O senhor conhece essa história? Sim! Meu pai e meu avô foram escravos! A escravidão só acabou no Brasil em 1888, o nosso país foi o último a acabar com a escravidão! Toda gurizada ficou espantada!

Técnica: som de espanto de criança!

Locução 10:(Narrador)- O seu Francisco colocou mais lenha na fogueira:

(Seu Francisco)-Os negros trabalhavam em sua maioria nas lavouras de cana-de-açúcar, nas minas de ouro e fazendas de café...

Locução 11-(NARRADOR)-Por um instante os meninos de afastaram e começaram a conversar entre si:

(Os meninos) que eram os pilares da economia do Brasil colonial! Já pensou se não fossem negros?

Locução 12(Narrador)- Seu Francisco interferiu na conversa dos garotos!

Técnica: Som de interferência.

(Seu Francisco) Exatamente! Prá vocês verem, os imigrantes só chegaram no final do século XIX! Antes disso o Brasil foi todo construído pelos que aqui estavam!

Locução 13(Narrador)- Novamente indagou Toinzinho?

(Toinzinho)-Mas então sem o trabalho dos negros o Brasil não existiria? Sim Toim...Inclusive alguns políticos da época diziam isso! Mas infelizmente isso era usado para justificar a escravidão, e não como base para reconhecer o direito desses seres humanos!!!

Locução 14(Narrador)- Joana entrou na conversa e indagou ao avô?

(Joana): Mas os escravos realizavam outros tipos de serviço, não é? Seu Francisco. Sim! Eram ferreiros, sapateiros, carpinteiros, vendedores... mas os negros não se acomodavam à escravidão! Eles se rebelavam através de movimentos como o de Palmares e outros quilombos! Ela continuou perguntando! E o que eram quilombos? Seu Francisco na sua sapiência ia explicando! Eram povo – ações escondidas nas matas, formadas pelos escravos fugitivos! Além das fugas individuais, havia violentos combates contra os senhores e os feitores...Para controlar os escravos e garantir a segurança dos senhores e a produção, os feitores e capitães do mato eram muito severos e desumanos, torturando escravos rebeldes até a morte...

Técnica: barulho de chicotadas.

Locução 15(Narrador): Por volta de 1675, o rei dos quilombos dos Palmares Ganzá-Zumba, negociou a paz com o governador Pedro de Almeida, recebendo terras do morro do Cucáu, mas foi traído e morto!

Seu Francisco já está cansado disse a garotada:
(Mazinho) Como seu Francisco nos deu uma grande lição sobre os Zumbis dos palmares e a história da África, vamos entregá-lo o presente e cantar mais uma vez parabéns...

Locução 16(Narrador)- Para coroar o final feliz da história todos alegres e abraçados comemoraram cantando os parabéns pra você!!!!

Técnica: Música de parabéns com algazarra.

Locução 17(Narrador)- E no final se despediram e foram todos para casa cantarolando, menos Joana que ficou fazendo companhia a seu avô!!!

Técnica: Música de criança cantarolando.


FIM



NOVELA DE RÁDIO


ANTONIO PAIVA RODRIGUES-CONCLUDENTE DE JORNALISMO

Paivinhajornalista

Publicado no Recanto das Letras em 19/04/2007
Código do texto: T455979

 I Encontro de Parlamentares Negras e Negros das Américas e do Caribe/Documento Oficial
 

        O I Encontro de Parlamentares Negras e Negros das Américas e do Caribe, realizado entre os dias 21 e 23 de novembro em Brasília, produziu o seguinte documento oficial, reproduzido do site do deputado Luiz Alberto:

"Carta de Brasília - Versão oficial

      Reunidos em Brasília no I Encontro de Parlamentares Negros e Negras
das Américas e do Caribe, organizado pela Frente Parlamentar em Defesa da
Igualdade Racial, de 21 a 23 de novembro de 2003, parlamentares da América
Latina, acompanhados de representantes de movimento negro e organizações
sociais, decidimos subscrever a presente Carta de Brasília reafirmando nossa
identidade como afro-descendentes, reconhecendo o caminho de nossos
ancestrais e os compromissos assumidos por nossos governos com nossos povos
e comunidades contidos nas Declarações e Planos de Ação de Santiago e
Durban.

      Reconhecemos que nos encontramos na terra de Zumbi dos Palmares, herói
ancestral que liderou lutas de libertação contra a escravidão e que deve
servir de modelo e inspiração tanto para a comunidade negra do Brasil como
para todos os países onde se encontram os filhos e filhas da Diáspora
Africana.

    Consideramos que:

    Os povos e comunidades afro-descendentes têm contribuído de forma
fundamental para a construção de todas as sociedades americanas e
caribenhas;

Não haverá democracia verdadeira nas Américas e no Caribe sem a inclusão das
mulheres e homens negros;

Os afro-descendentes são um grupo de cerca de 150 milhões nas Américas e no
Caribe, a maioria dos quais vivem em pobreza, e que esta condição é agravada
para as mulheres afro-descendentes;

Nossos governos são signatários das Declarações de Durban e Santiago, embora
a maioria deles não tem se empenhado nos compromissos assumidos;

Os afro-descendentes estão escassamente representados nos poderes do Estado
e particularmente nos congressos e parlamentos, em função de que devemos
redobrar nossos esforços e nosso trabalho. E esta exclusão se agudiza para
as mulheres negras;

Os esforços de inclusão de nossos povos e comunidades devem considerar tanto
uma visão universalista, que promova políticas públicas universais para
erradicar a pobreza de nossos países com uma perspectiva de gênero e racial,
assim como uma visão focalizada, que promova políticas públicas e legislação
específica para os afro-descendentes;

Nossos países se encontram imersos em processos de integração através de
acordos tais como MERCOSUL, PACTO ANDINO, CARICOM, SICA. Uma das expressões
mais importantes desse processo é a Área de Livre Comércio das Américas,
ALCA, em cujo bojo não estão presentes a situação de exclusão,
particularmente da situação de abandono histórico de nossos povos e
comunidades. Por isso, como parlamentares negros e negras devemos participar
intensamente deste debate e das negociações sobre a ALCA, das quais têm
estado ausentes até mesmo os parlamentos da região;

O Brasil está na iminência de aprovar o Estatuto da Igualdade Racial, o qual
representa um salto qualitativo e histórico na abordagem da situação dos
afro-brasileiros;

A Colômbia, tal qual outros países, tem promovido mudanças legislativas
constitucionais que promovem a inclusão racial. No entanto, não contamos com
mecanismos para intercâmbio dessas experiências;

Não existem programas de cooperação nem de relações internacionais entre os
países Latino Americanos e os países da África e que o Brasil deu um passo
importante nesse sentido;

A preservação das religiões de matrizes africanas é premissa fundamental na
afirmação da identidade e da cultura dos afro-descendentes.

Nos comprometemos a:

Impulsionar uma nova forma de fazer política baseada no respeito à inclusão
dos homens e mulheres afro-descendentes;

Criar um grupo de trabalho de parlamentares negros e negras das Américas
para promover e trabalhar na construção do Parlamento Negro das Américas e
da Rede de Legisladores Afro-descendentes;

Instar os parlamentos da região a que tenham uma participação ativa no
controle político das negociações sobre a ALCA, participando nos esforços
para incorporar a visão e perspectiva dos povos e comunidades
afro-descendentes;
 

Instar os governos a que fortaleçam os blocos regionais e a que promovam
consultas populares sobre a ALCA, para que tomem decisões que realmente
considerem a situação da maioria da população e não somente de uma pequena
parte;

Participar ativamente nas discussões dos processos de reformas fiscais,
sociais e políticas, e propostas de legislação para promover a igualdade
racial e de gênero;

Promover legislação e políticas de ação afirmativa que tomem como base o
Estatuto da Igualdade Racial do Brasil e a Lei 70 de 1993 da Colômbia, entre
outros corpos de legislação;

Promover nos nossos congressos e parlamentos a necessidade de aprofundar as
relações de cooperação horizontal entre os países da América Latina, Caribe
e da África, que contribuam com o desenvolvimento social, econômico e
cultural dos países de ambos continentes;

Elaborar uma publicação conjunta para a América Latina que compile a
legislação em favor dos afro-descendentes, como instrumento para o avanço
regional nessa área;

Instalar um portal de informação na internet que permita visualiza as ações
e propostas dos legisladores e legisladoras negros, assim como colocar a
informação sobre políticas e legislação;

Participar como parlamentares negros e negras na Cumbre das Américas e na
Cumbre Íbero-Americana que se realizam em 2004;

Instar os governos a alocarem recursos financeiros e humanos para a
implementação dos acordos de Santiago e Durban especialmente aos
relacionados com os povos e comunidades afro-descendentes e garantam o
processo de avaliação na conferência Santiago + 5;

Instar o Congresso Nacional do Brasil a aprovar o Estatuto da Igualdade
Racial e garantir os recursos financeiros para sua implementação, o qual
deverá servir como marco geral para os países da América Latina;

Instar o Congresso do Equador a discutir e aprovar o projeto sobre direitos
coletivos do povo afro-equatoriano. Da mesma forma, instamos todos os
congressos da região que têm pendentes legislação em favor dos
afro-descendentes, que a aprove;

Realizar o II Encontro de Parlamentares Afro-descendentes das Américas e
Caribe na Colômbia em 2004.

O I Encontro de Parlamentares Negros e Negras das Américas e do Caribe
consolida-se como elemento importante da articulação política internacional,
conferindo à questão racial no continente a visibilidade necessária para a
ruptura com a lógica da subjugação que ainda hoje exclui mais de 150 milhões
de pessoas negras.

O compromisso firmado em Brasília gira em torno da defesa e preservação do
que se relaciona à inserção social, à cultura e à tradição dos
afro-descendentes nas Américas e no Caribe. Nessa perspectiva, trabalharemos
para que as demandas reprimidas por séculos de exploração e desestruturação
material, simbólica e espiritual do nosso povo façam parte da agenda
política dos nossos países, assegurando o bem-estar de nossas comunidades.
 

Câmara dos Deputados
Brasília, 23 de novembro de 2003".
http://www.luizalberto.com/encontros.htm

 Consciência Negra – Jogral - O ALUNO NOVO

De Emílio Carlos

(Em cena o Aluno 1 e o Grupo de Alunos. O jogral é encenado, com
gestos e expressão corporal)


1 – Tudo bem?

GRUPO – Tudo.

1 – Vou contar uma novidade pra vocês.

GRUPO – (vozes desencontradas) Conta. Eu quero saber. Me fala.

1 – Vai entrar um aluno novo na escola.

GRUPO – Legal!

1 – Só que... bem...

GRUPO – O que é que tem?

1 – Ele é preto.

GRUPO – (estranha) Preto?

1 – É. Vocês sabem: preto.

GRUPO – Assim? (cada um levanta um retalho de tecido preto ou um
pedaço de papel)

1 – Não, assim não. Ninguém tem essa cor.

GRUPO – (apontam o retalho) Isto é preto.

1 – ‘Tá certo, ó: o aluno novo é “de cor”.

GRUPO – Que cor?

1 – Preta.

GRUPO – Preta? Assim? (levantam o retalho de novo)

1 – ‘Tá certo, vai: ele é negro.

GRUPO – E daí?

1 – Daí que... sei lá, sabe.

GRUPO – “Sei lá” o que?

1 – Na nossa escola? Não combina.

GRUPO – Por que não?

1 – Aqui é uma escola mais de branco, sabe...

GRUPO – E eles?

(Entram alunos orientais, morenos claros, etc. Podem estar
caracterizados com roupas de seus países/povos).

1 – Bem... quer dizer...

GRUPO – Isso é preconceito contra o negro.

1 – Não, não é isso. É que...

GRUPO – E logo você, que também é negro?

1 – Eu? Com essa cor aqui?

GRUPO – É negro. Se você for para determinados países – como os
Estados Unidos – será considerado negro.

1 – Mas eu moro aqui.

GRUPO – Tudo por causa da sua bisavó.

1 – O que é que tem ela?
GRUPO – Você sabe...

1 – Não sei não.

GRUPO – Ela era negra.

1 – Shhhh! Falem baixo!

GRUPO – Por que a vergonha
              Se os negros construíram o Brasil
              Fazem parte da nossa história
              Deram sua cultura, seu suor
              e até o sangue pelo nosso país?

1 – Eu não tinha pensado nisso.

GRUPO – A cor da pele não importa
              O que importa é a pessoa

1 – Isso é verdade. Tem negro que tem alma de branco

GRUPO – Tsc, tsc, tsc
              Isso é discriminação
              A alma não tem cor
              Somos todos iguais
              Perante a lei
              E perante Deus

1 – Certo: agora eu entendi o que é rascismo

GRUPO – Racismo: discriminação de uma pessoa de qualquer raça.

1 – Entendi: chega de preconceito.

GRUPO – Isso: chega de preconceito
              Contra o negro, contra o índio
              Contra o gordo, contra o magro
              Contra o alto, contra o baixo
              Tudo isso é preconceito!
              Fora com o preconceito!

1 – Viva a igualdade!

GRUPO – Viva!

1 – Viva os negros!

GRUPO – Viva!

1 – Viva os índios!

GRUPO – Viva!

1 – E um viva para todos os brasileiros.

GRUPO – Viva!



F I M

Veja mais material nos ARQUIVOS DA EDUCAÇÃO:
- entre no orkut
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Abraços pedagógicos.
Danton.

 O Racismo: um cancro mundial

como se manifesta?                                        

Este Presidente é Branco!
Este  Presidente é  Negro!


Uma pessoa preconceituosa, não é necessariamente hostil. Nem é, necessariamente, alguém que o expressa verbalmente, mas que no intimo sente repulsa diante da ideia de ter pessoas de outra raça como amigos, ou vizinhos.
 
 O individuo preconceituoso, pode revelar de forma muito subtil, sentimentos persistentes de superioridade. Talvez prove a paciência deles por tecer comentários de mau gosto, e com piadas e conotações raciais.
 
Ou, em vez de tratá-los como a iguais, talvez assuma um ar de condescendência, agindo como se, por fazer deles seus amigos, estivesse fazendo-lhes um favor. Outra forma de alguém demonstrar preconceito é exigir de certas pessoas um padrão mais elevado de consecução, embora lhes preste menor reconhecimento.
 
 E, se tais pessoas falham, talvez esteja inclinado a atribuir a falha a motivos raciais. Ou talvez condene, em certa raça, uma conduta que tolera na sua própria raça. Todavia, tal pessoa ficaria tremendamente ressentida diante de qualquer sugestão de que “ela” tem preconceito, tão completo é o engano de si mesma.
 
 Quão cedo na vida se adquire o preconceito?
 
O psicólogo Gordon Alport observou a tendência da mente humana
de “pensar com o auxílio de categorias”. Isto se evidencia até nas criancinhas. Elas logo aprendem a diferençar os homens das mulheres, os cães dos gatos, as árvores das flores, e até o branco do preto.
 
 Mas, será que simplesmente observar tais diferenças torna preconcebidas as crianças? Não necessariamente. Mas elas ouvem e observam muito bem, aquilo que os adultos dizem. Poucos pais infelizmente mandam os seus filhos brincar com crianças de outras raças.
 
Todavia, se a criança nota que seus pais têm prevenção para com alguém de outra raça, ou não se sentem à vontade com ele, a criança poderia similarmente assumir tais atitudes negativas. Depois existem também as diferenças culturais, a influência doutros coleguinhas e dos veículos informativos, e ainda outros factores, que podem todos juntos combinar-se para reforçar tal preconceito.
 
 Notamos pois resumidamente, como o preconceito se manifesta, ainda que subtilmente,  e quão cedo na vida se pode adquirir este cancro mundial.
 
A pergunta que surge a cada um de nós é; manifesto eu tais atitudes aqui descritas? Será que posso melhorar neste campo? Tenho eu contribuído por palavras e acções, para que a minha família demonstre atitudes preconceituosas?
 
Se por acaso você se enquadrar, numa única discrição aqui mencionada, procure melhorar, este deste modo está contribuindo para remover este cancro mundial, a saber, o preconceito.
 
A Bíblia diz em Actos 10:34 e 35 “ E, abrindo Pedro a boca, disse: Reconheço, na verdade, que Deus não faz distinção de pessoas; mas que lhe é agradável aquele que, em qualquer nação, o teme e obra o que é justo. “   Deus  não  é  parcial!!
 
Nota: Tradução da Bíblia Sagrada de: João Ferreira de Almeida
 
José  
Valgode


 

 
"Dia da Consciência Negra" retrata disputa pela memória histórica

Preservar a memória é uma das formas de construir a história. É pela disputa dessa memória, dessa história, que nos últimos 32 anos se comemora no dia 20 de novembro, o "Dia Nacional da Consciência Negra". Nessa data, em 1695, foi assassinado Zumbi, um dos últimos líderes do Quilombo dos Palmares, que se transformou em um grande ícone da resistência negra ao escravismo e da luta pela liberdade. Para o historiador Flávio Gomes, do Departamento de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a escolha do 20 de novembro foi muito mais do que uma simples oposição ao 13 de maio: "os movimentos sociais escolheram essa data para mostrar o quanto o país está marcado por diferenças e discriminações raciais. Foi também uma luta pela visibilidade do problema. Isso não é pouca coisa, pois o tema do racismo sempre foi negado, dentro e fora do Brasil. Como se não existisse".

Construindo o "Dia da Consciência Negra"

O 20 de novembro trata da data do assassinato de Zumbi, em 1665, o mais importante líder dos quilombos de Palmares, que representou a maior e mais importante comunidade de escravos fugidos nas Américas, com uma população estimada de mais 30 mil. Em várias sociedades escravistas nas Américas existiram fugas de escravos e formação de comunidades como os quilombos. Na Venezuela, foram chamados de cumbes, na Colômbia de palanques e de marrons nos EUA e Caribe. Palmares durou cerca de 140 anos: as primeiras evidências de Palmares são de 1585 e há informações de escravos fugidos na Serra da Barriga até 1740, ou seja bem depois do assassinato de Zumbi. Embora tenham existido tentativas de tratados de paz os acordos fracassaram e prevaleceu o furor destruidor do poder colonial contra Palmares.

Há 32 anos, o poeta gaúcho Oliveira Silveira sugeria ao seu grupo que o 20 de novembro fosse comemorado como o "Dia Nacional da Consciência Negra", pois era mais significativo para a comunidade negra brasileira do que o 13 de maio. "Treze de maio traição, liberdade sem asas e fome sem pão", assim definia Silveira o "Dia da Abolição da Escravatura" em um de seus poemas. Em 1971 o 20 de novembro foi celebrado pela primeira vez. A idéia se espalhou por outros movimentos sociais de luta contra a discriminação racial e, no final dos anos 1970, já aparecia como proposta nacional do Movimento Negro Unificado.

A diversidade de formas de celebração do 20 de novembro permite ter uma dimensão de como essa data tem propiciado congregar os mais diferentes grupos sociais. "Os adeptos das diferentes religiões manifestam-se segundo a leitura de sua cultura, para dali tirar elementos de rejeição à situação em que se encontra grande parte da população afro-descendente. Os acadêmicos e os militantes celebram através dos instrumentos clássicos de divulgação de idéias: simpósios, palestras, congressos e encontros; ou ainda a partir de feiras de artesanatos, livros, ou outras modalidades de expressão cultural. Grande parte da população envolvida celebra com sambão, churrasco e muita cerveja", conta o historiador Andrelino Campos, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.


Capoeira- trabalho desenvolvido pela Associação
dos Moradores de Plataforma AMPLA. Créditos: Antonia dos Santos Garcia


Para a socióloga Antonia Garcia, doutoranda do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é importante que se conquiste o "Dia Nacional da Consciência Negra" "como o dia nacional de todos os brasileiros e brasileiras que lutam por uma sociedade de fato democrática, igualitária, unindo toda a classe trabalhadora num projeto de nação que contemple a diversidade engendrada no nosso processo histórico".

Diferente do 20 de novembro o 13 de maio perdeu força em nossa sociedade devido a memória histórica vencedora: a que atribuiu a abolição à atitude exclusiva da princesa Isabel, aparentemente paternalista e generosa Isabel, analisa o historiador Flávio Gomes. Pesquisas recentes têm recuperado a atuação de escravos, libertos, intelectuais e jornalistas negros e mestiços para o 13 de maio, mostrando como este não se resumiu a um decreto, uma lei ou uma dádiva. Esses estudos também têm resgatado o significado da data para milhares de escravos e descendentes, que festejaram na ocasião.
São poucos os locais onde se mantêm comemorações no 13 de maio. No Vale do Paraíba, no estado de São Paulo, o 13 de maio é dia de festa. "Não porque a princesa foi uma santa ou porque os abolicionistas simpáticos foram fundamentais, mas porque a população negra reconhece que a Abolição veio em decorrência de muita luta", diz Gomes. Albertina Vasconcelos, professora do Departamento de História da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, também lembra que a data é celebrada em vários centros de umbanda na Bahia como o dia do preto-velho e que moradores antigos do Quilombo do Bananal, em Rio de Contas, Bahia, contam que seus pais e avós festejaram o 13 de maio de 1888 com muitos fogos e festas.

Na opinião de Vasconcelos "é importante comemorar, não para contrapor uma data a outra, os heróis brancos aos heróis negros, mas porque é necessário tomarmos consciência da história que está nessas datas, que traz elementos da nossa identidade". Para a pesquisadora, assim seria possível contribuir para desmistificar toda a construção ideológica produzida sobre o povo negro.

Nas escolas: muita proposta, pouca mudança
No início de seu mandato o presidente Lula aprovou a inclusão do Dia Nacional da Consciência Negra no calendário escolar e tornou obrigatório o ensino de história da África nas escolas públicas e particulares do país. Embora a decisão tenha sido comemorada, alguns pesquisadores ressaltam que existem obstáculos a serem ultrapassados para que a proposta se transforme em realidade. "Em geral, a história dada segue o livro didático e ele é insuficiente para dar conta de uma forma mais ampla e crítica de toda a história", ressalta Vasconcelos. Essa avaliação da historiadora é confirmada pela professora de história Ivanir Maia, da rede estadual paulista. "A maioria dos professores se orienta pelo livro didático para trabalhar os conteúdos em sala de aula. Nos livros de história, por exemplo, o negro aparece basicamente em dois momentos: ao falar de abolição da escravatura e do apartheid".

Campos destaca que alguns livros didáticos de história têm sido mais generosos ao retratar a "história dos vencidos", mas ressalta que a maioria, inclusive os livros ligados a sua área - a geografia -, continua a veicular os fatos sociais de forma depreciativa, seja referente ao Brasil ou a África. "Encontramos com fartura os elementos de modo civilizatório ocidental como a única verdade que merece maiores considerações", exemplifica. Uma iniciativa importante que ocorreu nesse período foi o controle dos livros didáticos distribuídos pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), visando evitar a distribuição de livros contendo erros conceituais e representações negativas sobre determinados indivíduos e grupos. Mas, na opinião de Garcia, seria necessário exigir uma maior revisão nessas obras: "os livros didáticos precisariam abordar a participação do povo negro na construção do país, na construção da riqueza nacional, na acumulação do capital e também as suas batalhas, rebeliões, quilombos e suas lutas mais contemporâneas".

Paula Cristina da Silva Barreto, professora da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia, destaca que, além dos livros didáticos, outro foco importante são as propostas de mudança na formação dos professores. "Foi tímido o trabalho feito pelo MEC nessa direção até o momento", critica a pesquisadora. Na avaliação dela, sem professores bem preparados para abordar temas complexos, como os abordados nos PCNs, "é muito difícil obter sucesso com a alteração curricular e existe uma grande probabilidade de que as escolas não coloquem em prática o que foi proposto". Os baixos salários pagos e as condições de trabalho desanimadoras nas escolas são fatores também destacados pelos pesquisadores como possíveis responsáveis pelo pequeno envolvimento dos professores com propostas que visam abordar a diversidade étnica e problematizar a questão do negro no Brasil no interior das escolas.



Puxada de rede - AMPLA - Associação dos Moradores de Plataforma

Experiências educativas alternativas
Existem diversos programas educativos espalhados pelo país que são propostos e organizados por entidades ligadas aos movimentos negros brasileiros. Para Campos, a diferença fundamental entre essas propostas e o ensino escolar "é o comprometimento daqueles que montam os programas. Em geral são frutos de experiências de grupos ligados aos problemas dos afro-descendentes; buscam, sobretudo, a eliminação da desigualdade através de um instrumento poderoso: a consciência cada vez maior da coletividade". Como exemplos, o pesquisador cita o Projeto da Mangueira, voltado para os esportes, que já existe há muito tempo, além de experiências que têm levado meninos e meninas às escolas de sambas-mirins no Rio de Janeiro.

Barreto, que tem acompanhado de perto alguns projetos na área de educação implementados por organizações anti-racistas e/ou culturais de Salvador, destaca como exemplos bem sucedidos a Escola Criativa do Olodum, o projeto de extensão pedagógica do Ilê Aiyê e o Ceafro. "Essas experiências têm sido importantes por fomentarem o debate e gerarem demandas por mais qualidade do ensino público, por um currículo menos eurocêntrico e mais multicultural e multirracial, por melhores livros didáticos e por um ambiente racialmente mais democrático nas escolas", diz Barreto. O mais interessante é que esses projetos se transformaram em referência para as políticas adotadas por órgãos oficiais como o Ministério Educação (MEC) e as Secretarias de Educação. Combinando educação formal e não-formal esses projetos tratam, por exemplo, de conteúdos presentes no currículo oficial em espaços como os barracões dos terreiros de candomblé ou as quadras dos blocos afro; outros utilizam parte da produção cultural das organizações - letras de música, mitos africanos etc. - no currículo das escolas regulares. O ensino de História da África, na escola do Ilê Aiyê, já acontece há vários anos.

Para Barreto "é de fundamental importância o fato de que as crianças e jovens negros e mestiços são positivamente valorizados nesses projetos, elas são consideradas como portadores de direitos, o que tem um efeito direto sobre a auto-imagem e a construção da identidade pessoal e coletiva". Atualmente, a socióloga trabalha com projetos educativos voltados para a democratização do acesso e a permanência de estudantes negros e mestiços no ensino superior e coordena o programa A cor da Bahia, que há dez anos realiza pesquisas, publicações e atividades de formação na área de relações raciais, cultura e identidade negra na Bahia. Desde 2002, o programa desenvolve o projeto tutoria, que cria estratégias diversas para estimular, apoiar e promover a formação de estudantes negros que ingressaram na Universidade Federal da Bahia. Com o apoio do programa Políticas da cor fornecem bolsas de ajuda de custo aos alunos e orientação acadêmica, visando o ingresso destes no mercado de trabalho e em cursos de pós-graduação em condições mais competitivas. Na opinião de Barreto, ainda há muito para ser feito com no sentido de assegurar uma maior democratização - em termos raciais e econômicos - do sistema de ensino superior público.

"É preciso entender que a desigualdade no Brasil tem cor, nome e história. Esse não é um problema dos negros no Brasil, mas sim um problema do Brasil, que é de negros, brancos e outros mais", avalia Gomes.

 Ações afirmativas e políticas de afirmação do negro no Brasil

Carlos Vogt

I
De um modo geral, os estudos e as atitudes intelectuais e políticas voltados positivamente à questão do negro no Brasil só se desenvolvem, efetivamente, no século XX, embora tenha havido, no século XIX, toda uma literatura abolicionista, de Castro Alves a Joaquim Nabuco que, no entanto, tratou o negro como um problema homogeneizado pela escravidão, enquanto mácula.
É verdade que Nina Rodrigues, apontado como pioneiro dos estudos africanos no Brasil, vinha trabalhando sobre o tema desde o final do século XIX e que já em 1900 havia publicado no Jornal do Comércio o que viria a ser depois capítulo do livro póstumo Os africanos no Brasil, de 1933. Dois outros capítulos desse livro foram também publicados antes da morte do autor em Paris, em 1906: "As sublevações de negros no Brasil anteriores ao século XIX. Palmares", no Diário da Bahia e "Sobrevivências totêmicas: festas populares e folclore", novamente no Jornal do Comércio.
A advertência que Silvio Romero fizera no mesmo ano da Abolição da Escravatura, em 1888, sobre a urgência de se voltarem os estudos no Brasil para a questão do negro aparece como epígrafe no livro de Nina Rodrigues:
[...] temos a África em nossas cozinhas, como a América em nossas selvas, e a Europa em nossos salões [...] Apressem-se os especialistas, visto que os pobres moçambiques, benguelas, monjolos, congos, cabindas, caçangas... vão morrendo..."
A adoção da advertência de Silvio Romero por Nina Rodrigues, como epígrafe, resume bem as contradições de atitudes em relação ao negro que marcaram a obra do médico e intelectual maranhense na Bahia: Defensor dos valores culturais dos africanos no Brasil e dos seus direitos à liberdade de suas práticas religiosas, mesmo contra as autoridades policiais que as perseguiam, Nina Rodrigues irmanava-se também com Silvio Romero na visão "científica" da inferioridade racial do negro:
"O critério científico da inferioridade da Raça Negra nada tem de comum com a revoltante exploração que dele fizeram os interesses escravistas dos norte-americanos. Para a ciência não é esta inferioridade mais do que um fenômeno de ordem perfeitamente natural, produto da marcha desigual do desenvolvimento filogenético da humanidade nas suas diversas divisões ou secções (...) A Raça Negra no Brasil, por maiores que tenham sido os seus incontestáveis serviços à nossa civilização, por mais justificadas que sejam as simpatias de que a cercou o revoltante abuso da escravidão, por maiores que se revelem os generosos exageros dos seus turiferários, há de constituir sempre um dos fatores de nossa inferioridade como povo (...)."


II
Em 1941, M. Herskovits, autor, na mesma década e na seguinte, de vários trabalhos sobre a cultura afro-brasileira, publica o livro The myth of the negro past. Nele, logo no início declara a intenção de, realizando pesquisas sobre a cultura de origem africana no EUA, contribuir para "melhorar a situação inter-racial" nesse país.
Constrói, assim, livro para ajudar a compreender a história do negro, história até então ignorada, por zelo e por descuido, contrapondo-se a cinco "mitos" então vigentes. Primeiro, que os negros, como crianças, reagem pacificamente a "situações sociais não satisfatórias"; segundo, que apenas os africanos mais fracos foram capturados, tendo os mais inteligentes fugido com êxito; terceiro, como os escravos provinham de todas as regiões da África, falavam diversas línguas, vinham de culturas bastante variadas e tendo sido dispersos por todo o país, não conseguiram estabelecer um "denominador cultural" comum; quarto, que, embora negros da mesma origem tribal conseguissem, às vezes, manter-se juntos nos EUA, não conseguiam manter a sua cultura porque esta era patentemente inferior à dos seus senhores; quinto, que "o negro é assim um homem sem um passado".
Ao escrever o prefácio da 2ª edição de seu livro, em 1958, Herskovits reconheceria que muitas coisas haviam mudado, desde a primeira edição, em 1941 e que o número de negros que rejeitavam seu passado estava diminuindo paulatinamente, o mesmo acontecendo com as atitudes dos brancos em relação aos pontos de vista anteriores, para, então, arrematar:
"E o negro americano, ao descobrir que tem um passado, adquire uma segurança maior de que terá um futuro."
A oposição entre o otimismo culturalista de Herskovits e o pessimismo cientifista de Nina Rodrigues explica-se, entre outras coisas, pela própria mudança dos paradigmas teóricos no tratamento dos africanismos na América e pelo descrédito científico em que acabara caindo a frenologia lombrosiana e que tanto marcava a postura intelectual de Nina Rodrigues e de tantos outros no Brasil, inclusive Euclides da Cunha em Os sertões.
Mas, como se viu, o racismo cientificista de Nina Rodrigues não era a única vertente analítica de seus estudos sobre o tema. A simpatia pela cultura dos povos africanos para cá trazidos como escravos, os processos de suas adequações, transformações e influências pela interação com os outros elementos constitutivos dessa nova realidade - o branco europeu e o indígena americano, em particular, como lembrava, veemente e dramático, Silvio Romero - , essa simpatia, pois, resultando em atitudes intelectuais positivas em relação ao negro, foi o que sobreviveu ao modismo positivista do médico Nina Rodrigues, fazendo do etnólogo, que nele também convivia, a influência mais importante para o desenvolvimento dos estudos do negro no Brasil no início do século XX.
Nessa linha, muitos foram os seus seguidores ou, ao menos, seus admiradores nas décadas seguintes, caso, em particular, de Artur Ramos e de Edison Carneiro, mesmo quando se contrapunham em diferenças teóricas e metodológicas, ou quando se alinhavam nas disputas regionais, Gilberto Freyre puxando, é claro, para Pernambuco, pela primazia do autêntico das manifestações culturais africanas no Brasil.
E o que acontece, por exemplo, na avaliação que Edison Carneiro faz no artigo "O Congresso Afro-Brasileiro da Bahia", descrito em 1940, no qual ao tecer elogios a esse encontro realizado em 1937, o contrapõe, ao mesmo tempo, ao Congresso do Recife, de 1934, pelo critério da maior ou menor pureza das apresentações dos ritos e cerimônias apresentados, num e noutro caso, aos congressistas:
"Esta ligação imediata como o povo negro, que foi a glória maior do Congresso da Bahia, deu ao certame um colorido único", como já previra Gilberto Freyre. Artur Ramos, em carta que me escreveu sobre a entrevista ao Diário de Pernambuco, dizia:
"O material daí que [Gilberto Freyre] julga apenas pitoresco constituirá justamente a parte de maior interesse científico. O Congresso do Recife, levando os babalorixás, com sua música, para o palco do Santa Isabel, pôs em xeque a pureza dos ritos africanos. O Congresso da Bahia não caiu nesse erro. Todas as ocasiões em que os congressistas tomaram contato com as coisas do negro foi no seu próprio meio de origem, nos candomblés, nas rodas de samba e de capoeira."

III
Edison Carneiro, no artigo "Nina Rodrigues", escrito em 1956 reconhece, apesar das críticas, os méritos do autor de Africanos no Brasil, em especial, o de ter proposto um método comparativo para o estudo dos comportamentos do negro no Brasil e na África. Edison Carneiro e Artur Ramos são herdeiros desse método, o que é explicitamente reconhecido pelo primeiro quando escreve no mesmo artigo acima citado:
"Línguas, religiões e folclore eram elementos dessa comparação a que a história dava a perspectiva final. Deste modo ganhou o negro a sua verdadeira importância em face da sociedade brasileira."
Compare-se, agora, o que vai dito nesse último período da citação de Edison Carneiro com a observação de Herskovits, transcrita mais atrás ("E o negro americano, ao descobrir que tem um passado, adquire uma segurança maior de que terá um futuro."), e ter-se-á uma medida objetiva de quanto os propósitos político-intelectuais desses autores eram coincidentes, levando-se em conta, é claro, as diferenças entre a sociedade americana e a sociedade brasileira.
Mas, num caso e noutro, tratava-se de reencontrar a história do negro pela via da valorização de sua cultura, na África e no país de destino, comparando-a nas duas situações, fazendo-o, dessa vez chegar aos EUA ou no Brasil, onde quer que fosse, pela porta da dignidade e da distinção que o passaporte dos ritos, das línguas, da complexidade cultural de suas origens lhe conferia.
É a fase heróica dos estudos do negro no Brasil. Por volta de 1950 encerra-se, segundo Edison Carneiro essa fase e tem início a chamada fase sociológica desses estudos, conforme se pode ler no seu artigo programático "Os estudos brasileiros do negro", de 1953:
"Se o negro com sua presença alterou certos traços do branco e do indígena, sabemos que estes, por sua vez, transformaram toda a vida material e espiritual do negro, que hoje representa apenas 11% da população (1950), utiliza a língua portuguesa e na prática esquecem as suas antigas vinculações tribais para interessar-se pelos problemas nacionais como um brasileiro de quatro costados. Tudo isso significa que devemos analisar o particular sem perder de vista o geral, sem prescindir do geral, tendo sempre presente a velha constatação científica de que a modificação na parte implica em modificação no todo, como qualquer modificação no todo importa em modificações em suas partes."
Estava encerrada a fase afro-brasileira dos estudos do negro no Brasil e firmava-se, particularmente, com os trabalhos de Florestan Fernandes, Octavio Ianni e Fernando Henrique Cardoso, na chamada Escola Sociológica de São Paulo, uma nova tendência desses estudos agora voltados para a análise da estrutura de classes no país e, nela, para a história particular do negro, primeiro como escravo, depois como trabalhador livre marcado pelo estigma do preconceito de cor.
Como escrevemos no livro Cafundó - A África no Brasil, que publicamos em co-autoria com Peter Fry e com a colaboração de Robert Slenes, ao romantismo da fase teórica substitui-se um realismo de inspiração sociológica, de fundo social e de aspiração socialista.
Resumindo, o movimento desses estudos poderia ser caracterizado, em um primeiro passo, por sua ênfase cientificista ou médico-legalista, embora já com as sementes do culturalismo que dominaria o panorama da segunda fase, havendo em um terceiro momento, a predominância de uma visão sociológica da questão, como acabamos de dizer.


IV
Essas três fases dos estudos do negro no Brasil contribuem também, de certa forma, para a compreensão das diferentes fases por que passou o movimento negro no século XX, do ponto de vista de suas lutas, de suas reivindicações, de suas bandeiras e das explicações científicas, culturais e sociológicas que fundamentam as ênfases de suas ações políticas.
Assim, nos anos 1920, as próprias organizações negras refletiam a visão de que o principal problema da população negra no Brasil estava nela mesma, dadas as condições precárias de sua educação formal, a fraqueza das organizações em si mesmas e a conseqüente falta de habilidade para concorrer às disputas no mercado de trabalho, tudo isso acrescido, é claro, do "preconceito de cor" que dificultava e obstruía a integração social e discriminava o negro, pela cor, na sociedade.
A democracia racial, como ideal político e social programático, concomitante à redemocratização do país em 1945, coincidente também com o fim da Segunda Guerra Mundial e com a vitória dos países aliados sobre o nazi-fascismo, propicia o desenvolvimento de ações no campo educacional, cultural e mesmo psicanalítico, como é o caso do Teatro Experimental do Negro, no Rio de Janeiro, que, através de diferentes organizações, visam à reforçar, quando não despertar, o sentimento de orgulho e de distinção por ser negro, desse modo, contribuir para capacitá-lo a enfrentar o seu pior inimigo na sociedade, o preconceito racial, agente também perturbador do progresso integrado do país na comunhão das raças, dos credos, das diferenças.
Vê-se por aí o quanto esse movimento reflete características próprias da segunda fase dos estudos do negro no país, e o quanto os seus objetivos lembram os propósitos enunciados por Herskovits, no EUA e por Artur Ramos ou Edison Carneiro, entre nós.
A transformação da democracia social de ideário político em mito e em ideologia e, portanto, em expediente de ilusionismo social vai se dar, de maneira consistente, a partir dos anos 1970 e, talvez, um dos fatos mais importantes dessa nova tendência e postura seja a fundação em 1978, em São Paulo, do Movimento Negro Unificado.
Não será difícil identificar nesse momento aspectos coincidentes com os que se encontram na linha sociológica dos estudos do negro e caracterizam, de um modo geral, a terceira fase desses trabalhos, porquanto a grande responsável pela situação de exclusão do negro está na verdade, na estrutura de dominação da sociedade pelo establishement branco, consolidado no governo e difundido na sociedade civil. Passa-se, pois, da democracia racial, integradora e geradora de plenos direitos para a denúncia de uma dominação real assentada sobre a base de um racismo difuso e poderoso.


V
O que se segue, até hoje, na história dos estudos e dos movimentos negros no Brasil, tem, grosso modo, a ver com as características acima apontadas para as diferentes fases de sua evolução e transformação nos campos teórico e prático das ações que lhes são próprias.
Em 1988, no ano do centenário da Abolição da Escravatura, foi promulgada a nova Constituição da República Federativa do Brasil. Nela, em decorrência da lutas pelos direitos civis dos negros, ficou consagrado, no Título II - Dos direitos e garantias fundamentais -, Capítulo I - Dos direitos e deveres individuais e coletivos -, Artigo 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
Artigo XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei.
A regulamentação desse parágrafo veio em seguida pela Lei nº 7716, de 5 de janeiro de 1989, modificada pela Lei 008882 de 3 de junho de 1994 e novamente modificada em 13 de maio de 1997, pela Lei nº 9459, que acrescentou também ao Artigo 140 do Código Penal relativo ao crime de injúria por utilização de "elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem", estabelecendo pena de "reclusão de um a três anos e multa".
O passo seguinte seria o das ações afirmativas, cujo modelo podia ser buscado nos EUA dos anos 1960, e, mais recentemente, no governo de Nelson Mandela, na África do Sul.
Aqui, sim, numa quarta fase, opera-se uma mudança importante no paradigma clássico dos estudos e dos movimentos negros no Brasil, embora ela própria seja decorrente também das grandes transformações que na economia, na política, e na cultura o mundo contemporâneo passa a conhecer, sobretudo a partir de 1989, com a queda do muro de Berlim e a consolidação do fenômeno da globalização em todos os setores da vida social. Deixa-se de lado o ideal do Brasil mestiço para proceder às ações pelo reconhecimento étnico-racial dos negros.
Leia-se, nesse sentido, o que escreve Antonio Sérgio Alfredo Guimarães no artigo "Acesso de negros às universidades públicas", de 2002:
Nos primeiros tempos, de 1995 até bem recentemente, a reação da sociedade civil, representada pelos seus intelectuais e meios de comunicação de massa, foi largamente contrária à adoção de políticas de cunho racialista. O movimento negro, assim como os poucos intelectuais brancos que defendiam tais políticas, viram-se politicamente isolados, por mais de uma vez sob a acusação de vocalizar e deixar-se colonizar culturalmente pelos valores norte-americanos. De fato, nada mais contrário à identidade nacional brasileira, tal como foi formada historicamente - como identidade autocolonial, culturalmente híbrida e racialmente mestiça -, que o reconhecimento étnico-racial dos negros. Assim, os que por ventura tinham sólidos interesses na manutenção das desigualdades encontraram aliados cujos motivos eram puramente ideológicos, pessoas que viam nas políticas dirigidas preferencialmente aos negros a penetração no Brasil do 'multiculturalismo' e do 'multirracionalismo' de extração anglo-saxônica".

VI
Do ponto de vista das ações afirmativas, o país caminhou bastante nesses últimos anos no que diz respeito aos cenários mais positivos para a mobilidade social, o desenvolvimento pessoal, a formação profissional e as chances de concorrência e competição do homem e da mulher negra no mercado de trabalho.
Mas há ainda, muito o que avançar e muitas resistências a serem quebradas entre os intelectuais e a sociedade civil se se considerar, por exemplo, os dados de 2001 da pesquisa direta do programa "A cor da Bahia/UFBA" e do I Censo Étnico Racial da USP e IBGE, também apresentados no artigo acima referido.
Segundo esses dados, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) o número de alunos brancos é de 76,8%, o de negros 20,3% para uma população negra no estado de 44, 63%; na Universidade Federal do Paraná (UFPR) os brancos são 86,6%, os negros, 8,6%, para uma população negra no estado de 20,27%; na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), brancos são 47%, negros 42,8% e a população negra no estado, 73,36%; na Universidade Federal da Bahia (UFBA), 50,8% são brancos, 42,6% negros e 74,95% a população negra do estado; na Universidade de Brasília (UnB), são brancos 63,74%, são negros 32,3%, tendo o Distrito Federal uma população negra de 47,98%; na Universidade de São Paulo (USP), os alunos brancos somam 78,2%, os negros, 8,3% e o percentual da população negra no estado é de 27,4%.
Vê-se, assim, que o déficit produzido por essas diferenças é bastante desfavorável ao negro nos estados onde se encontram essas universidades: 24,33% na UFRJ, 11,67% na UFPR, 30,56% na UFMA, 32,35% na UFBA, 15,68% na UnB e 19,1% na USP.
Como disse, há, contudo, avanços, sobretudo por parte do governo quanto à adoção de ações afirmativas relativamente à população negra do país, entre elas o abandono oficial da doutrina da "democracia racial" desde a Conferência Mundial Contra a Discriminação Racial, realizada em Durban, na África do Sul, acompanhada de instituição de cotas de emprego em vários ministérios e serviços, além da criação de programas voltados para os direitos humanos, para a formação profissional e para o reconhecimento do direito à titulação de propriedade de terras remanescentes de quilombos, entre outros.

VII
As cotas nas universidades, como já tive oportunidade de defender, tem um papel estratégico nessa luta por igualdade de oportunidades e são parte de um conjunto maior de ações afirmativas que tendem, felizmente, a crescer cada vez em nossa sociedade.
No artigo "O repto da proteção", a propósito do tema das políticas públicas de proteção e de emancipação, visito algumas páginas de romances e crônicas de Machado de Assis em que se apresentam situações que desenham, em traços de atenta observação crítica, as relações sociais entre brancos senhores e negros escravos, ou libertos, e mostram, com leveza de estilo e sensibilidade, a natureza complexa e o peso dos problemas que essa sociedade escravocrata legaria para as gerações futuras no Brasil.
Retomo aqui as duas crônicas do livro Bons dias, ambas de 1888, uma do dia 19 de maio e outra do dia 26 de junho, que registraram, com a fina ironia que é própria do autor e com o cinismo oportunista característico de muitos de seus personagens, duas situações reveladoras do ethos dos senhores no day after do ato legal da abolição.
Na primeira, do dia 19 de maio, seis depois da promulgação pela princesa Isabel da Lei Áurea, o cronista nela representado, apresenta-se como um profeta post factum e vangloria-se, para efeito de suas aspirações políticas, de ter-se antecipado ao 13 de maio alforriando "um molecote que tinha, pessoa de seus dezoito anos mais ou menos."
De maneira sinceramente hipócrita relata ainda, explicando seu gesto pela causa final de seus interesses pessoais e estes, pelas razões eficientes da classe social a que pertence:
"O meu plano está feito; quero ser deputado, e, na circular que mandarei aos meus eleitores, direi que, antes, muito antes da abolição legal, já eu, em casa, na modéstia da família, libertava um escravo, ato que comoveu a toda a gente que dele teve notícia; que esse escravo tendo aprendido a ler, escrever e contar, (simples suposição) é então professor de filosofia no Rio das Cobras; que os homens puros, grandes e verdadeiramente políticos, não são os que obedecem à lei, mas os que se antecipam a ela, dizendo ao escravo: és livre, antes que os poderes públicos, sempre retardatários, trôpegos e incapazes de restaurar a justiça na terra, para satisfação do céu."

Na outra, a do dia 26 de junho transcorridos mais de um mês da Abolição, o nosso cronista fictício arquiteta agora maneiras de tirar proveito econômico e não apenas político da nova situação.
Como um Tchitchikof dos trópicos trata de comprar, tal qual no romance de Gogol, Almas mortas, no caso, escravos libertos, com documentos datados de antes do 13 de maio e, assim, poder "vendê-los" ao poder público para recuperação das "perdas" sofridas com a abolição.
"Suponha o leitor que possuía duzentos escravos no dia 12 de maio, e que os perdeu com a lei de 13 de maio. Chegava eu ao seu estabelecimento, e perguntava-lhe:
- Os seus libertos ficaram todos?
- Metade só; ficaram cem. Os outros cem dispersaram-se; consta-me que andam por Santo Antônio de Pádua.
- Quer o senhor vender-mos?
Espanto do leitor; eu, explicando:
- Vender-mos todos, tanto os que ficaram, como os que fugiram.
O leitor assombrado:
- Mas, senhor, que interesse pode ter o senhor...
- Não lhe importe isso. Vende-mos?
- Libertos não se vendem.
- É verdade, mas a escritura de venda terá a data de 29 de abril; nesse caso, não foi o senhor que perdeu os escravos, fui eu. Os preços marcados na escritura serão os da tabela da lei de 1885; mas eu realmente não dou mais de dez mil-réis por cada um."


VIII
Machado de Assis, que o crítico americano Harold Bloom considera o "maior literato negro surgido até o presente" deixou-nos um legado artístico ímpar no Brasil e na literatura universal de todos os tempos. Por ele pudemos conhecer melhor a sociedade imperial brasileira e com ele, entrarmos no átrio dos conflitos da sociedade republicana que se anunciava, sem historicismo, sem sociologismo, sem programatismo panfletário. Falando de homens e mulheres de seu tempo na provinciana capital federal, o Rio de Janeiro que os navios estrangeiros procuravam evitar com medo das contaminações epidêmicas da região, o autor fixou, como nenhum outro, em imagens de poética sobriedade, não apenas as cores locais de quadros sociais inesquecíveis, mas também as finas incertezas e ásperas decisões da alma humana, suas silenciosas perversidades, seus levianos conflitos morais, a profundeza das dores reparáveis, a exlusividade substituível dos amores, a densidade dos vazios feita de presenças impositivas e de imposições de ausências plenas, a religiosidade desconfiada de um narrador que desconfia, como num meta-Eclesiastes de seu ceticismo e de sua própria desconfiança.
Não há em Machado de Assis a tentação do fácil nem tampouco a tipificação do difícil. Por isso, falando de seu tempo e de seu espaço local como não poderia deixar de fazer, fala-nos de uma atemporalidade, contudo histórica, do homem prisioneiro de sua eterna finitude. É como pensar Shakespeare e não ser levado à sociedade elizabetana, contexto necessário do texto que se lê ou da peça a que se assiste. Impossível fazê-lo, como impossível é também não desgarrar-se, pela leitura, das circunstâncias históricas e que dão vida às suas personagens e mergulhar na universalidade cômica e trágica de seus dramas, de nossos conflitos.
O legado literáro de Machado de Assis também é assim. Põe-nos na sala senhorial da casa do Engenho Novo e atira-nos, casmurros, à frustração anunciada da impossibilidade ontológica de nos reencontrarmos conosco mesmo, no tempo, em Mata Cavalos, ou vice-versa.
Com o legado estético, o legado ético. E é parte dele, com a mesma discreta perspicácia, o registro de situações de puro exercício de dominação senhorial de brancos em relação aos negros, ou de debochada esperteza negocial dos que se habituram a procurar tirar vantagem em tudo, como acontece nas duas crônicas aqui referidas.
É uma situação historicamente datada. Não deixa, contudo, de remeter-nos, pela própria historicidade, que lhe dá concretude, à força explicativa do paradigma social que apresenta.
É contra a permanência desse modelo de relações sociais constituído na tradição patriarcal branca da sociedade brasileira que se fez o esforço intelectual e político, caracterizado nas diferentes fases de sua evolução e transformação, tal como as apresentamos, para com ele romper e para definitivamente superá-lo.
As ações afirmativas do movimento negro e as políticas públicas de sua afirmação no Brasil são uma etapa contemporânea desse longo processo histórico. As cotas nas universidades públicas, uma parte estratégica desse movimento.